O ano legislativo de 2025 começou com os holofotes direcionados para os novos presidentes eleitos da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. Eleitos por ampla maioria nas duas Casas, Hugo Motta (Republicanos-PB) e Davi Alcolumbre (União-AP) assumem agora a função de coordenar os trabalhos e a agenda de votações. Do outro lado da Praça dos Três Poderes, o Executivo depende de uma agenda propositiva para fazer o Governo andar. Não será fácil. Com dois anos pela frente e, neste momento, enfrentando uma queda na aprovação, o presidente Lula terá de discutir com aliados as melhores estratégias na relação com o Legislativo.
Desde que o Congresso Nacional aprovou as emendas parlamentares impositivas, em 2015 (individual) e depois em 2019 (bancadas), analistas têm apontado uma perda considerável da capacidade de coordenação do Executivo. O perfil dos presidentes da Câmara e do Senado também importa. Políticos mais conciliadores ou, inversamente, com baixo interesse em colaborar impactam a agenda do Governo e as escolhas estratégicas do Executivo.
Nesse contexto, o uso de Medidas Provisórias (MPs), um instrumento que é prerrogativa do Executivo e que tem força de lei, costuma ser uma escolha. As MPs entram em vigor no momento em que são publicadas, ou seja, o Governo consegue produzir uma nova regra jurídica.
O problema é que as MPs dependem, posteriormente, da apreciação pelo Congresso Nacional em até 60 dias, prorrogáveis por mais 60. No caso de rejeição ou não apreciação pelo Congresso no prazo determinado, a MP perde seus efeitos. Em outras palavras, o Executivo até pode produzir uma norma jurídica imediatamente e fazer sua agenda política avançar, mas terá de negociar na sequência com o Congresso.
Desde 2003, já tivemos 1.184 medidas provisórias publicadas. O presidente que mais recorreu a esse instrumento foi Jair Bolsonaro, especialmente devido à crise da pandemia de Covid-19. Na sequência, vêm os dois primeiros governos do presidente Lula, que teve índices de aprovação popular relativamente altos.
A análise da série histórica da publicação e apreciação das MPs sugere que essa estratégia do Executivo vem perdendo força. A taxa de medidas provisórias aprovadas pelo Congresso Nacional caiu de 98%, no início da série, para cerca de 50% e, mais recentemente, para patamares entre 20% e 14%. É uma redução substancial. Ela mostra que o uso da prerrogativa do Governo para editar MPs, criar normas jurídicas e fazer sua agenda política avançar passou a enfrentar maior resistência no Congresso.

Quando agrupamos os dados pela taxa de sucesso, ou seja, das MPs que foram editadas e aprovadas pelo Congresso, vemos que os percentuais mais expressivos foram nos governos Lula I e Lula II. As taxas de sucesso dos dois primeiros governos Lula (95% e 91%) foram muito acima da média de 70%. Os governos Dilma apresentaram, por sua vez, taxas próximas da média.
Como esses dados acima consideram períodos de quatro ou menos anos de governo, reorganizamos a análise, considerando apenas os dois primeiros anos de cada presidente eleito desde 2003. Novamente, os resultados indicam que a estratégia do Executivo para usar MPs e promover suas agendas perdeu muita força. O Congresso Nacional apresenta uma tendência clara de menos vontade para aprovar essas medidas. A taxa de sucesso dos governos para os dois primeiros anos do mandato caiu de 98% (Lula I) para 78% (Dilma II), seguida de 55% (Temer) e, finalmente, apenas 17% (Lula III). Essa é a pior taxa da série histórica analisada.
Outra maneira de o Legislativo influenciar a estratégia do Executivo ao usar MPs para governar é deixando que as medidas caduquem, ou seja, não sejam apreciadas no prazo determinado. Esse indicador também demonstra como a relação entre Executivo e Legislativo, quando observada pelos percentuais das MPs que caducaram, mudou. O percentual de medidas provisórias que perderam eficácia, em relação ao total de MPs editadas por cada governo, vem aumentando. Ou seja, o Legislativo deixou de apreciar as medidas e elas perderam eficácia. Esse percentual foi de apenas 4% no primeiro Governo Lula, subiu para 37% no Governo Temer e já alcançou 56% no atual mandato do presidente Lula.
Em resumo, se o avanço Legislativo sobre o Orçamento Federal, com o uso de emendas impositivas, é um indicador de quão difícil se tornou o trabalho do Executivo para coordenar maiorias ou manter unida a sua coalizão, a estratégia de recorrer às MPs enfrenta o mesmo problema. A análise dos dados demonstra que as medidas provisórias já não são um instrumento seguro para promover mudanças ou implementar novas regras. Essas dificuldades refletem a mudança nas relações de poder entre o Executivo e o Legislativo nos últimos anos. São mudanças que exigirão do Executivo formas mais eficientes para promover sua agenda no Legislativo.