Investigando a evolução das clivagens políticas no Brasil, o artigo de Borba, Silva e Amorim analisa dados de cinco ondas do World Values Survey (1991-2018). A pesquisa revela a persistência de uma divisão de valores do tipo “liberal-fundamentalista” ao longo de quase 30 anos , mostrando que eleitores mais fundamentalistas tendem a ser mais materialistas e a ter menor preferência pelo PT. O estudo conclui que essa clivagem tem raízes históricas na opinião pública, sugerindo que havia uma demanda latente por representação política baseada no conservadorismo moral, que foi posteriormente capitalizada por novas forças políticas. A relação entre o PT e essa clivagem também mudou ao longo do tempo, refletindo a transformação de sua base eleitoral.
O Desafio Investigado: O estudo aborda a ascensão de debates culturais e de uma nova direita no Brasil, que culminou na eleição de Jair Bolsonaro em 2018. O desafio central é entender se essa divisão de valores na sociedade é um fenômeno recente ou se possui raízes históricas mais profundas na opinião pública , que estavam latentes por falta de uma oferta eleitoral que as representasse.
A Proposta Central: A pesquisa investiga a persistência e a evolução de clivagens políticas no Brasil, com foco na dimensão “liberal-fundamentalista”. A análise é feita a partir de dados de cinco ondas da pesquisa World Values Survey (1991, 1997, 2006, 2014 e 2018). Utilizando técnicas de análise fatorial e teoria da resposta ao item, o estudo testa a relação dessa clivagem com as prioridades de valores dos eleitores (pós-materialismo) e com a preferência partidária pelo Partido dos Trabalhadores (PT).
Evidências e Argumentos: Os resultados revelam a existência de uma diferença de valores do tipo liberal-fundamentalista que se mantém constante ao longo de quase 30 anos. Essa divisão é definida principalmente por questões morais como tolerância a aborto, prostituição, divórcio e homossexualidade. O estudo confirmou que eleitores com valores pós-materialistas tendem a ser mais liberais. Também se verificou que, nos anos 1990, os eleitores do PT eram significativamente menos fundamentalistas, mas essa associação se tornou menos estável e clara nas décadas seguintes, refletindo mudanças na base eleitoral do partido.
Implicações e Contribuições: A principal contribuição do estudo é demonstrar que a clivagem liberal-fundamentalista tem raízes históricas na opinião pública brasileira. Isso sugere que havia uma demanda estável por uma representação política baseada no conservadorismo moral muito antes de haver uma oferta eleitoral clara, como a que foi capitalizada por Bolsonaro. O estudo também ressalta o papel significativo da mobilização religiosa no Brasil e contribui com evidências empíricas do contexto brasileiro para a literatura mais ampla sobre clivagens políticas.
Siga @redem.inct no Instagram e @redem_inct no X para saber mais sobre os estudos realizados por nossos pesquisadores!

Autores:
Julian Borba é doutor em Ciência Política pela UFRGS. Professor do Departamento de Sociologia e Ciência Política da UFSC. Interessado nos temas opinião pública e comportamento político.
Gregorio Silva é Doutor em Sociologia e Ciência Política, com ênfase em Ciência Política (2024), pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), atua como profissional vinculado a três instituições de ensino: Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), Fundação Universidade para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí (UNIDAVI) e Instituto Federal Catarinense (IFC).
Lucas Amorim é Cientista Político realizando doutorado no Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Ciência Política da UFSC. Defendi minha dissertação de mestrado no Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade de Brasília (IPOL/UnB) em março de 2023