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O ponto que une Bolsonaro e Mauro Cid no depoimento ao STF

Por mais de duas horas, o ex-presidente Jair Bolsonaro buscou defender, em depoimento no Supremo Tribunal Federal (STF), nesta terça-feira (10/06), uma tese controversa para escapar de uma possível condenação por tentativa de golpe de estado.

Para Bolsonaro, as hipóteses que discutiu com auxiliares e membros da Forças Armadas, após a derrota eleitoral de 2022, estavam amparadas na Constituição Federal, logo, não há que se falar em “golpe”.

Nuvem de palavras do depoimento de Bolsonaro ao STF

O problema dessa tese é que a Constituição não autoriza qualquer medida para decretação de Estado de Sítio ou Estado de Defesa em razão de um resultado eleitoral. 

Um dia antes, o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, tenente-coronel Mauro Cid, havia confirmado ao STF que o ex-presidente teve acesso à chamada minuta do golpe, que explicitava “considerandos” para uma possível decretação de Estado de Sítio ou Estado de Defesa. Era a maneira que Bolsonaro buscava para reverter o resultado das urnas, que deu vitória ao então candidato Luiz Inácio Lula da Silva.

Apesar disso, a análise textual dos depoimentos do ex-presidente e de Mauro Cid mostra que eles convergiram ao menos em um ponto: negativas. A análise mostra que a palavra mais repetida por Bolsonaro foi “não”, com 319 registros, seguida por “ministro” (49), numa referência, nas suas respostas, a Alexandre de Moraes.

Nuvem de palavras do depoimento de Mauro Cid ao STF

Embora estivesse na condição de delator, Cid, por sua vez, repetiu 625 vezes a palavra “não”, seguida por “presidente”, com 108 registros. Numericamente, a diferença na quantidade de “nãos” é resultado do maior tempo de depoimento de Cid, que durou cerca de 3h50.

Na maior parte das vezes, Cid utilizou o termo “não” para afirmar que não se recordava ou não se lembrava de fatos, datas ou eventos mencionados pelo ministro Alexandre de Moraes, advogados dos demais réus ou do Procurador-Geral, Paulo Gonet. 

Relações da palavra “não” mencionadas por Mauro Cid. 
Relações da palavra “não” mencionadas por Bolsonaro

No caso de Bolsonaro, as relações da palavra “não” ocorreram, com mais frequência, nas negativas apresentas às questões levantadas pelo Procurador e o ministro, Alexandre de Moraes. 

Eixos dos depoimentos de Bolsonaro e Cid

As mais de 2h de depoimento de Bolsonaro ao STF podem ser interpretadas a partir de três núcleos temáticos. Parte disso, claro, deve-se ao encaminhamento das perguntas. Mas, como se viu, Bolsonaro aproveitou muito do seu tempo para discorrer sobre políticas do seu governo.

A distribuição dos termos mais correlacionados mostra que as falas do ex-presidente se concentraram no tema “eleições e urnas”, representado no conjunto de palavras na cor vermelha, no gráfico abaixo. Entre as palavras mais correlacionadas, 34% se concentraram nesse tema. Outros 27% estão concentradas no grupo de palavras na cor verde, que pode ser classificada pelo tema “minuta do golpe”.

 
Análise de correspondência discurso de Bolsonaro ao STF

Outros dois grupos de palavras se misturam, não constituindo um tema uniforme, mas estão aí termos que sugerem falas do ex-presidente sobre o seu cotidiano durante os quatro anos de governo, bem como menções a políticas que, segundo a sua visão, beneficiaram a população. Esses dois grupos de palavras sobrepostas (azul e verde claro) representam, portanto, o discurso mais político de Bolsonaro.

No caso de Mauro Cid, a distribuição da suas falas apresentam um padrão mais claro em três grande grupos. O grupo azul escuro (28%) refere-se às explicações de Cid sobre os manifestantes na porta dos quartéis, enquanto o grupo vermelho, com 45% dos temos mais associados, estão explicações do ex-ajudante sobre questões envolvendo a minuta do golpe. É neste grupo que estão muitas das declarações de Cid de “não me recordo” e “não me lembro”.

Análise de correspondência discurso de Mauro Cid ao STF

O terceiro grupo de palavras mais associadas, grupo verde com 26%, estão termos que remetem às falas de Cid sobre a participação dos militares e dos grupos que se encontravam com o ex-presidente para tratar da minuta do golpe. 

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Fábio Vasconcellos

Doutor em Ciência Política pelo IESP (2013) e mestre em Comunicação Social pela UERJ (2008). Professor associado da Faculdade de Comunicação UERJ. Temas de interesse: Comportamento Eleitoral; Comunicação Política; Eleições; Opinião Pública; Analise de Dados.

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